terça-feira, 2 de junho de 2015

E vai ser assim?

E vai ser assim?


Quando cheguei ao Colégio Militar, carregava muita ansiedade pelo medo de novos colegas, pelas dificuldades que poderia encontrar. Mas, logo na primeira semana, as aulas de matemática ministradas pelo saudoso Coronel Felizardo de Paula Pessoa Mendes, pelas aulas de ciências do Padre Luís, pela História do Major Uirandé Augusto Borges e pela Geografia do professor Wilson, tranquilizaram meu espírito. Aos poucos conheci colegas que se tornaram amigos e espantaram meus medos.
Identifiquei-me com quase todos, mas havia dois deles que me acompanhavam a pé até a Praça da Estação, economizando uma ficha de ônibus. Lá íamos nós, eu-392, Heine-369 e Rodrigues-301. Sob o sol intenso, vez por outra, tirávamos a boina para desviar o suor que caía nos olhos. Somente ao subir os batentes do Palácio Progresso e atravessar o Calçadão Cerrolim, o forte vento secava nossas camisas molhadas de tanto suor.
Nestes mais de 35 anos, reencontramo-nos e foi muito bom vivenciarmos tantas coisas, seja na vida militar, seja na civil. Filhos, esposas: nossas famílias cresceram! Encontrei-me com todos, cada um com seu sucesso pessoal!
O Heine, que me era mais próximo nos velhos tempos de CMF, talvez por sermos do interior e compartilharmos histórias semelhantes, talvez por termos nascidos em cidades vizinhas: ele nascido num berço mais alto, na serra da Ibiapina; eu num berço inferior, no pé de serra de Reriutaba, contou-nos como também foi difícil sua adaptação na Preparatória de Cadetes.
Logo na primeira aula de inglês, a professora cumprimentou a turma e, de imediato com um aluno paranaense, iniciou uma conversa em inglês fluente que assustou nosso amigo arataca Lira Reis, cujas orelhas só eram acostumadas com o verbo to be.  E ficou a pensar: “E vai ser assim?”. Deste jeito, tô lascado!
Toda aula era uma dificuldade: “E vai ser assim?”.  E, numa nova disciplina, surgia mais um tenebroso mestre que, com giz e compasso, tentava desalinhar duas retas paralelas, provando ser possível a simbiose da geometria euclidiana com a curvatura espaço-tempo de Einstein. E, novamente, estava nosso amigo Heine, abstraído a dizer: “E vai ser assim?” Deste jeito, tô lascado!
Somente com as aulas de geometria descritiva, o 369 tranquilizou-se, pois era amigo do Príncipe Júnior e entendia bem sua épura, seus enunciados e diedros .
O tempo passou, veio a Academia Militar e muitas reclamações bolsonarianas ecoavam nos ouvidos dos aspirantes. Então, nosso conceituado atleta 369, sentindo que era muito suor para pouco soldo, pensou: “E vai ser assim?”


Lopes-392