terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Puas de Ouro



Puas de Ouro



Por volta dos anos 80 iniciava-se um novo ciclo em nossas vidas. De meninos de bicicletas, baladeiras e bola, passamos a saber o nome das meninas mais bonitas da praça e a frequentar um barzinho. Um dos primeiros foi o do Tiúba.  Ficava na Rua 25 de Setembro numa antiga casa de sobrado do seu Zezé, esposo da dona Lessinha. Com o dinheiro contado, experimentávamos uma dose de cachaça serrana com tira-gosto de metade de um limão. O Fernando Aguiar e o Marcelo foram os primeiros a provar a pinga e a se sentirem homens, franzindo a testa e estalando os dedos da mão direita no virar da primeira dose. O bar ficava no pavimento térreo de um sobrado em estilo colonial com janelas verdes de madeira mofada e paredes amarelas desbotadas pelo sol e pelas primeiras chuvas. Tinha quatro janelas no pavimento superior e, entre elas, três bocas de jacarés.  Era pelas bocas de jacarés que tomávamos banho de bicas em dias de chuvas pelas calçadas de minha cidade.
O carnaval chegava junto com as chuvas, era fevereiro e tínhamos 17, 18, 19 anos. Nossos pais, ainda novos, procuravam organizar as bandas e orquestras que iriam tocar no Reriutaba Clube. Ficávamos apreensivos se a banda municipal sob a liderança do seu Marçal iria dar conta da festa ou um novo conjunto vindo da capital aceitaria firmar o contrato com o clube da sociedade local com poucos sócios e pouco dinheiro.
Banda de música municipal


Tentávamos também contribuir para alegrar a cidade e, no afã e no orgulho da juventude, fundamos um bloco carnavalesco. Como se chamaria? Puas de Ouro!
Na época os componentes eram o Marcelo, mais integrado com músicas, emissoras de rádio, mais afoito com as garotas da sociedade; o Paulo, mais calado, porém mais danado com as meninas beiradeiras; o Zé Júnior também era ao estilo do Paulo; o Tarciano e o Paulo Filho, principiantes na turma; o James num estilo mais irreverente e o Zé Carlos Cabaceira mais introspecto, além de mim, o mais tímido, porém mais entusiasmado com o período momino. Em nosso bloco também se inscreveram crianças que nos seguiam os passos, como o Felipe e o Aguiarzinho.


Aguiar Neto, Paulo Filho, Zé Jr, Luiz Filho e Felipe Aguiar

Compramos tecido nas Lojas do Povo do seu Chaguinha e pedimos nossas mães para fazer uns macacões verdões. Depois fomos à tia Terezinha Memória que se prestou de seus dons de pintura e silk-screen para tornar nossos trajes mais vivos com o nome de nosso bloco. O resto era conosco; saíamos pelas rádios do Ipu e de Sobral, divulgando o carnaval de Reriutaba, o que gerava certo ciúme ao bloco doutros amigos, o chamado Bigode Preto, com maior número de componentes.



O símbolo de nosso bloco era uma raiz retorcida que mais se parecia com uma pua de madeira. Pintamos a pua e a enfeitamos com purpurina e areia prateada. Provavelmente nos tenham muito chamados de tolos, mas o que nos importava era nossa folia e diversão. Sempre saíamos em grupo, seja para a cidade vizinha do Araras, para as vesperais da AABB do Ipu, para a Cachoeira do Boi Morto, para a Cachoeira do Juré e também para os bares da cidade.


Felipe Aguiar, Mardônio, Tarciano, Zé Carlos, Paulo Filho, Luiz Filho, Zé Jr e Marcelo
A pua, ícone de nosso bloco, ainda se encontra guardada num depósito lá na minha casa de Reriutaba. Estive lá recentemente e a vi, desolada, deitada como se estivesse de ressaca dos carnavais passados.
 
Os bares que mais frequentávamos naquela época era o bar do Bá, situado ali quase defronte à saudosa Providência, que antigamente era uma instituição de ensino renomada e que quase todos ali estudamos. Pouco sobrou da Casa da Providência...!
Voltemos ao Bar do Bá: atendimento excepcional e um cardápio ímpar com camarões, filet trinchado com torradas, feijão verde com queijo e uma cerveja super gelada. O Edmar havia chegado do Rio de Janeiro recentemente e introduziu muitos petiscos dos cardápios cariocas. E gritava com meio sotaque carioca para a cozinha do bar: - Dessce aí um filet trincchado!
Mas o bar que mais provocávamos bagunça era no bar do João Abraão. Também recém-chegado do Rio de Janeiro, trouxe um pouco de sotaque e um bom cardápio ao seu bar que na realidade era um pequeno mercantil, que de sexta a domingo transformava-se em nosso ponto de encontro. Num desses carnavais, creio que no de 1990, estávamos todos no bar quando alguém saíu dos fundos do bar numa bicicleta pulando dos degraus e voando por cima das mesas como naquela cena do filme E.T. Foram-se garrafas de cerveja pelos lados e gargalhadas por todas as mesas. Ninguém se machucou, mas iniciou-se uma guerra de ovos que o João Abraão não se incomodava. Apenas contabilizava num caderno de espiral Tilibra, tirando sempre a caneta Bic da orelha direita, dizendo: - Dezoito ovoss.....Crasssh (mais um tiro de ovo).....Dezenove ovosss.....! Outro amigo gritava: - João Abraão fecha a conta! – Ok, garoto!....3 segundos depois:...um ovo atingiu o peito do João Abraão e ele logo fechou a conta, dizendo: Agora são trinta ovossss. Muito paciente, sempre aturou a bagunça em seu bar, talvez porque nunca saía no prejuízo......pelo menos de ovosss quebrados!
Terminávamos a bebedeira no bar do Luís Fulô e por ali nos reunimos até poucos anos atrás, quando um de nossos amigos dos Puas de Ouro teve seu nome solenemente anunciado pelo Chico da Dó no palco de uma festa no pé-da-serra.  


Bar do Luís Fulô

O Luís Fulô que ía passando por trás do microfone, saudou o nome do amigo com um estrondoso barulho na boca do microfone como numa irreverência ao solene anúncio do Chico da Dó! Foi intriga de não mais frequentar o bar do Luís. Nós continuamos frequentando o barzinho, contrariando nosso amigo Marcelo, que hoje já não leva em conta a brincadeira do Luís Fulô,  apenas ri daqueles fatos.
Luiz Lopes Filho
Fortaleza-CE, 08/12/2011.


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